Aquele Caderno

Das leituras e como devemos performar nossas palavras

Consegui retomar o prazer pela leitura esses dias. Ando meio empacado lendo o livro e história da Jennette McCurdy por conta da temática, o peso que é ir percebendo e vivenciando, junto a ela, o convívio com a mãe narcisista e os pesos do que uma infância regrada a superproteção e alienação fazem e outras coisas. A escrita dela é boa, não é esse o ponto, mas realmente o tópico. Meu último livro foi o da Toni Lodge e parecia muito uma conversa, talvez por já saber o tom dela devido ao podcast, e foi um choque migrar da água pro vinho com temas parecidos mas distintos entre ambos os livros. Apesar de ainda estar no fim do primeiro terço do livro, por questões, resolvi encarar outro livro e o sentimento voltou.

Paul Conti consegue um assunto pesado e presente em muitas pessoas de uma maneira, não leve porém palatável. Falar de trauma parece não ter jeito certo mas o psiquiatra traz analogias, compartilha sua própria história e traz um olhar de encarar o trauma como, infelizmente, parte de nós mas, além disso, como tratar e tentar vencer a isso. Lendo o livro a dois dias e vendo que estou, ao meu ritmo, devorando, fiquei muito reflexivo sobre como é algo fundamental da nossa experiência humana, seja ela, escrita ou falada, mas sempre é podada e delimitada a lugares específicos e como isso, não só nos limita, mas nos satura. Segura esse pensamento por um momento!

Voltando de uma caminhada para dar uma acalmada nos pensamentos e sensações físicas, voltei para casa pensando em como há uma certa desorganização e falta de balanço nos meus horários profissionais, sendo que isso veio de aulas canceladas ou movidas hoje. Ainda assim, fiquei refletindo na necessidade de continuar procurando novas oportunidades e mudança de emprego. Simultaneamente, enquanto o computador ligava, li um breve toot que falava sobre busca de empresas por funcionários e a utilização do LinkedIn. E novamente me veio a questão da linguagem. Eu não sou uma pessoa que usa o LinkedIn. Eu estou lá, atualizo meu perfil, tento ficar de olho nas oportunidades, vagas e cenários, mas não é um ambiente em que eu consiga dizer “Eu estou aqui”. Eu imaginei, no início, que seria a rede social mais tranquila de usar porque as nossas atualizações ali são profissionais, mas eu esqueci de uma coisa gritante em relação a isso: a maneira que você precisa performar profissionalismo. Honestamente, mesmo odiando o Instagram e o que tem feito com a sociedade, eu ainda vejo pessoas que usam à sua própria maneira, eu sendo uma dessas (e dos teimosos que não conseguem sair dali), sem medo de terem perfis “desorganizados”, não seguindo tendências, só tendo como um álbum de recordações ou o que seja. No LinkedIn, como você quer ser notado, você precisa ser a pessoa-luz das empresas, o funcionário de ouro. A sensação é de sempre estar performando para um patrão invisível e, pelo amor, eu não consigo.

Voltando àquele pensamento que pedi pra segurar um pouco, por favor: todo esse pensamento de rede social profissional se alinhou com minha experiência de leitura porque, o que notei de Paul Conti é que ele não quer ter um livro de escrita acadêmica. Ele pode sim ser um profissional e suas abordagens, da parte que até agora li, serem alguma espécie de guia para outros psiquiatras, psicólogos ou mesmo pessoas que querem encarar seus próprios demônios com algum suporte teórico, mas ele não está fazendo isso se colocando no lugar de superioridade ou mesmo no patamar acadêmico que é tão distante de tudo.

Me vendo prestes a entrar na pós-graduação, ainda em Letras, não nego que toda essa questão de linguagem tem sido um grande temor meu. Primeiro que eu sei que a minha escrita final, o meu grande pedaço de dissertação vai ter que ser dentro dessas normas de linguagem neutra, se baseando sempre no que outras pessoas disseram e nunca dando opiniões diretas, mas as leituras que terei que fazer até essa produção me assustam: tudo tem que ser feito como um grande quebra-cabeças de técnicas, pensamentos e referências de autores outros, nada pode ser leve, uma simples conversa ou mesmo um texto tranquilo onde cada um consiga interpretar. Não falo de algo mastigado, mas de algo acessível e tranquilo.

Penso nisso, tentando trazer resultados nas minhas escritas. Penso em falar como uma pessoa real no meu perfil do LinkedIn, em escrever na primeira pessoa nos meus textos acadêmicos. Há aquele paralelo de que é interessante que escrevamos textos que tanto você, pessoa dentro de um ambiente acadêmico entenda, mas que também sua avó, uma pessoa comum qualquer, consiga pegar suas palavras e entender, mesmo que com dificuldade, mas não, se não a lógica social está quebrada. Pra mim, isso não dá. Eu vou tentar traçar meu caminho. A única coisa que eu quero, pensando nesse caminho, é que minhas palavras sejam compreendidas, não só isso mais úteis. Não quero dizer que “Estou contente em compartilhar que dei início aos meus estudos em tal e tal coisa na instituição X”, mas quero poder exercer o meu papel já que é necessário ocupar esses lugares, dizendo, com as minhas palavras e como sentir no momento, que consegui. Todo mundo sabe que a língua é vida, mas que vida é essa que precisa me silenciar pra existir?